quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Dos sermões de São Fulgêncio de Ruspe, bispo (Sermo 3,1-3.5-6:CCL 91 A, 905-909) (Séc. VI)



As armas da caridade

"Ontem, celebrávamos o nascimento temporal de nosso Rei eterno; hoje celebramos o martírio triunfal do seu soldado.
Ontem o nosso Rei, revestido de nossa carne e saindo da morada de um seio virginal, dignou-se visitar o mundo; hoje o soldado, deixando a tenda de seu corpo, parte vitorioso para o céu.
O nosso Rei, o Altíssimo, veio por nós na humildade, mas não pôde vir de mãos vazias. Trouxe para seus soldados um grande dom, que não apenas os enriqueceu imensamente, mas deu-lhes uma força invencível no combate: trouxe o dom da caridade que leva os homens à comunhão com Deus.
Ao repartir tão liberalmente o que trouxera, nem por isso ficou mais pobre: enriquecendo do modo admirável a pobreza dos seus fiéis, ele conservou a plenitude dos seus tesouros inesgotáveis.
Assim, a caridade que fez Cristo descer do céu à terra, elevou Estevão da terra ao céu. A caridade de que o Rei dera o exemplo logo refulgiu no soldado.
Estêvão, para alcançar a coroa que seu nome significa, tinha por arma a caridade e com ela vencia em toda parte. Por amor a Deus não recuou perante a hostilidade dos judeus, por amor ao próximo intercedeu por aqueles que o apedrejavam. Por esta caridade, repreendia os que estavam no  erro para que se emendassem, por caridade orava pelos que o apedrejavam para que não fossem punidos.
Fortificado pela caridade, venceu Saulo, enfurecido e cruel, e mereceu ter como companheiro no céu aquele que tivera como perseguidor na terra.  Sua santa e incansável caridade queria conquistar pela oração, a quem não pudera converter pelas admoestações.
E agora Paulo se alegra com Estêvão, com Estêvão frui da glória de Cristo, com Estêvão exulta, com Estêvão reina. Aonde Estêvão chegou primeiro, martirizado pelas pedras de Paulo,  chegou depois Paulo, ajudado pelas orações de Estevão.
É esta a verdadeira vida, meus irmãos, em que Paulo não se envergonha mais da morte de Estêvão, mas Estevão se alegra pela companhia de Paulo, porque em ambos triunfa a caridade. Em Estêvão, a caridade venceu a crueldade dos perseguidores, em Paulo, cobriu uma multidão de pecados; em ambos, a caridade mereceu a posse do reino dos céus.
A caridade é a fonte e origem de todos os bens, é a mais poderosa defesa, o caminho que conduz ao céu.  Quem caminha na caridade não pode errar nem temer.  Ela dirige, protege, leva a bom termo.
Portanto, meus irmãos, já que o Cristo nos deu a escada da caridade pela qual todo cristão pode subir ao céu, conservai fielmente a caridade verdadeira, exercitai-a uns para com os outros e, subindo por ela, progredi sempre mais no caminho da perfeição."

Dos Sermões de São Leão Magno, papa (Sermo 1 in Nativitate Domini, 1-3; PL 54,190-193) (Séc. V)




Toma consciência, ó Cristão, da tua dignidade

"Hoje, amados filhos, nasceu o nosso Salvador. Alegremo-nos. Não pode haver tristeza no dia em que nasce a vida; uma vida que, dissipando o temor da morte, enche-nos de alegria com promessa da eternidade.
Ninguém está excluído da participação nesta felicidade. A causa da alegria é comum a todos, porque nosso senhor, vencedor do pecado e da morte, não tendo encontrado ninguém isento de culpa, veio libertar a todos. Exulte o justo, porque se aproxima da vitória; rejubile o pecador, porque lhe é oferecido o perdão; reanime-se o pagão, porque é chamado à vida.
Quando chegou a plenitude dos tempos, fixada pelos insondáveis desígnios divinos, o Filho de Deus assumiu a natureza do homem para reconciliá-lo com seu criador, de modo que o demônio, autor da morte, fosse vencido pela mesma natureza que antes vencera.
Eis por que, no nascimento do Senhor, os anjos cantam jubilosos: Glória a deus nas alturas; e anunciam: Paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14). Eles vêem a Jerusalém celeste ser formada de todas as nações do mundo. Diante dessa obra inexprimível do amor divino, como não devem alegrar-se os homens, em sua pequenez, quando os anjos, em sua grandeza, assim se rejubilam?
Amados filhos, demos graças a Deus Pai, por seu Filho, no Espírito Santo; pois, na imensa misericórdia com que nos amou, compadeceu-se de nós. E quando estávamos mortos por causa das nossas faltas, ele nos deu a vida com Cristo (Ef 2,5) para que fôssemos nele uma nova criação, nova obra de suas mãos.
Despojemo-nos, portanto, do velho homem com seus atos; e tendo sido admitidos a participar do nascimento de Cristo, renunciemos às obras da carne.
Toma consciência, ó cristão, da tua dignidade. E já que participas da natureza divina, não voltes aos erros de antes por um comportamento indigno de tua condição. Lembra-te de que cabeça e de corpo és membro. Recorda-te que foste arrancado do poder das trevas e levado para a luz e o reino de Deus.
Pelo sacramento do batismo te tornaste templo do Espírito Santo. Não expulses com más ações tão grande hóspede, não recaias sob o jugo do demônio, porque o preço de tua salvação é o sangue de Cristo."

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Aparição de Nossa Senhora de Beauraing, na Bélgica



Onde aconteceu: Na Bélgica.

Quando: Em 1932 (1° parte).
              Em 1933 (2ª parte).

A quem: A cinco crianças (1932) e a um adulto (1933)

Os fatos: Beauraing em 1932 era um minúsculo povoado que nem nos mapas constava. Situado na região das Ardenas, planalto caracterizado por grandes penhascos, desfiladeiros e rios caudalosos, distante dez quilômetros da fronteira com a França.
        
Ao entardecer de 29 de novembro de 1932, cinco crianças, entre 09 e 15 anos, viram uma forte luz que envolvia um minúsculo Santuário de Nossa Senhora de Lourdes (estilo Capital), chamado na região de “gruta”.
        
As crianças eram três irmãos da família Voisin e dois da família Degeimbre.

Em 1 de dezembro já foi possível visualiza em meio a grande luminosidade que envolvia a “gruta” , a presença de uma pessoa de pequena altura. No dia seguinte, com maior nitidez, foi possível identificar no vulto uma belíssima Senhora, então as crianças caíram de joelhos, rezaram uma ave-maria e Albert Voisin indagou:

- A Senhora é, realmente a Virgem Imaculada?

Ela com a cabeça, respondeu afirmativamente. Voltou a perguntar:

- O que deseja que façamos?

Ela respondeu:

- Quero que sejam muito bons!
        
Os cinco retornaram em 4 de dezembro, e quando Nossa Senhora apareceu, Albert indagou:

- Quando devemos voltar?

A Virgem Santíssima disse:

- No dia da Imaculada Conceição!

Fernanda, irmã de Albert, questionou: 

- Precisamos conseguir a construção de uma Capela para a Senhora?

E a resposta foi simples e clara:

- “Sim”. E desapareceu.
        
Até o dia 08 de dezembro, Nossa Senhora manifestou-se por mais 3 vezes.

Chegando finalmente a quinta-feira, Festa da Imaculada Conceição, após tudo ter tomado conhecimento do que acontecia na pequena Beauraing, uma imensa aglomeração de aproximadamente dez mil pessoas se faziam presentes.

Nesse dia existia inclusive uma equipe médica para investigar a autenticidade dos fatos. Quando a Virgem Santíssima apareceu e as crianças caíram de joelhos em êxtase, foram propositalmente molestados, inclusive picados com fósforo acesos e cutucados com canivetes, não demonstrando nenhuma reação física, o que caracterizou um autêntico estado de êxtase.
 Após saírem dessa abstração espiritual comandada por Deus, nem marcas físicas das contusões foram encontradas.

Durante o mês de dezembro as crianças rezavam o terço, quase que diariamente, em frente ao minúsculo Santuário (Capital), sempre acompanhados por um número imenso de devotos e romeiros, porém Nossa Senhora poucas vezes manifestou-se.

Reafirmando o seu desejo de construírem ali um grande Santuário, disse:

-“Para que as pessoas se reúnam em romaria”.

A Aparição final ocorreu em 3 de janeiro de 1933, e ao questionarem Albert Voisin sobre o conteúdo da mensagem final, ela apenas disse:

- Bem, se querem saber, era um tanto desalentadora...

Quando todos davam por encerradas as manifestações de Nossa Senhora de Beauraing, os Céus ainda tinham planos para a região.

Em 11 de junho de 1933, um artesão chamado Tilman Come, morador de Pontaury, distante 50 quilômetros de Beuaraing, foi até a pequena “gruta” de Nossa Senhora de Lourdes local das Aparições, buscar um pouco de conforto, tendo essa decisão por fé, devido ao grande sofrimento que vivia nesse momento de sua vida, acometido de uma gravíssima moléstia na coluna vertebral, denominada espondilite, e que trazia dores terríveis, além do enrijecimento definitivo das articulações.
Em suma, estava morrendo.

E que grande sacrifício foi percorrer a distancia, apesar de pequena, pelas irregularidades da sala da entrada. Lá chegando, rezou diversas Ave-marias chamando a Deus, por intercessão de Nossa Senhora, por misericórdia. Quando já retornava sem nenhuma melhora, eis que, começa a retorcer-se dentro do carro por dores fortíssimas, causando pânico em sua esposa, ao lado, pensando que estava morrendo.

 As pessoas que também rezavam e estavam próximas ficaram chocadas ao verem seu estado, mas logo a seguir muito impressionados, pois de um momento para outro, viram-no deixar o carro caminhando normalmente, com o rosto sereno e fisicamente perfeito, sem nenhuma seqüela.

O fato espalhou-se rapidamente por toda a região e o país. Tilman Come explicou o momento em que contorceu-se de dores no carro, como um êxtase, pois perdeu a noção de tudo em seu redor, viu nitidamente Nossa Senhora que lhe sorria maternalmente, dizendo que “o veria amanhã”.

No dia seguinte ao retornar a “gruta”, já acompanhado por grande número de pessoas, Nossa Senhora manifestou-se novamente e disse-lhe:

- “Vim aqui para a glória da Bélgica e para preservar esta terra do invasor. Você precisa se apressar”.

OBS: Neste momento é preciso deixar bem claro que a Mãe de Deus está profetizando Hittler que em 1939, ou seja, 06 anos depois, durante a II Guerra Mundial, invadiria a Bélgica, apesar de todos os tratados de paz e neutralidade da Bélgica assinados com a Alemanha.

Lamentavelmente mais uma vez os homens preferiram acreditar nos homens, não levando em conta os Misericordiosos avisos de Deus. Pela incredulidade e ceticismo das classes dominantes, o povo belga sofreu terrivelmente nas mãos dos nazistas. Com isso Tilman Come passou a ser o principal interlocutor da Santíssima Virgem nesta Aparição.


Outros fatos importantes desta Manifestação:

__ Na Aparição de 5 de agosto de 1933 houve um comparecimento estupendo de devotos e romeiros, estimados em duzentas mil pessoas;

__ Na construção da grande Capela pedida por nossa Mãe, ela lembrou para preservarem a pequena capital;

__ No final do verão de 1933 em torno de 150 mil devotos compareciam na pequena “gruta”;

__ Durante as grandes romarias centenas de curas aconteciam;

__ Até junho de 1934, no Santuário provisório, compareceram aproximadamente 1,7 milhões de devotos; (Na época em Lourdes chegavam a 1 milhão, anualmente).

__ O bispo autorizou a devoção publica a Nossa Senhora de Beauraing, em 02 de fevereiro de 1943, durante a II Guerra Mundial e a ocupação nazista que sangrou o povo belga.

Por que não acreditam nos avisos de Deus, que sua Mãe Santíssima nos traz?

__ Dentre várias centenas, pelo menos a diocese reconheceu como autênticas duas curas por intercessão de Nossa Senhora de Beauraing;

__ O bispo diocesano em documento publico reconheceu perante o clero que a Mãe de Deus esteve em Beauraing; era o dia 02 de julho de 1949;

__ Finalmente em 21 de agosto de 1954, foi consagrada a belíssima basílicasolicitada pela Rainha do Céu e da terra.

__ A visitação anual, atualmente, aproxima-se de um milhão de romeiros, de diversos países.
        
“Foram precisos vinte e dois anos, mas mais uma vez a Celeste Comandante venceu pela força do Amor”.


 



terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Árvore de Natal: uma tradição católica criada por santos



            O costume de ornar um pinheiro nas festas de Natal data dos tempos do Papa São Gregório Magno (540-604), que impulsionou a cristianização das tribos germânicas no início da época medieval.
           Estas tribos tinham o costume esdrúxulo de adorarem árvores e lhes oferecerem sacrifícios.
           Os missionários e monges aproveitaram então a forma triangular do pinheiro para explicar aos bárbaros o mistério da Santíssima Trindade.
             Mas as coisas não eram fáceis.
            A primeira árvore de Natal remonta ao longínquo ano 615. São Columbano, monge irlandês fora à França para abrir mosteiros.
            Mas a indiferença dos habitantes era tal que ele estava quase desanimando.

          Numa noite de Natal, teve ele a ideia de cortar um pinheiro, única árvore verde nessa época do ano e iluminá-lo com tochas.
       Todo mundo ficou intrigado.
      A aldeia correu em peso a ver a maravilha.
       Então o santo monge pregou o nascimento do Menino Jesus!
      Mas são muitas as cidades que disputam a autoria da encantadora árvore.
        Segundo muitos, ela nasceu na Alsácia.
       Lá, na cidade amuralhada de Sélestat, o imperador Carlos Magno passou a Santa Noite do ano 775.
       Teria sido ele o inspirador da primeira árvore de Natal.
    Posteriormente, os habitantes da cidade deram forma definitiva à árvore natalina católica.

    Porém, o documento mais antigo que há em Sélestat é de 1521.
     A cidade de Riga, na Letônia, diz ter sido a primeira em expor uma árvore de Natal no ano do Senhor de 1510.
     É certo que no século XVI a árvore de Natal era montada no coro das igrejas da Alsácia representando a árvore do Paraíso.
     Ela era ornamentada com maçãs para lembrar o fruto da tentação dos primeiros pais.
   Mas tinha também representações de hóstias figurando os frutos da Redenção.
    Elas também contavam com anjos, estrelas de papel e muitas outras decorações.
      Escolhendo a árvore do Paraíso como símbolo das festividades do Natal, a Igreja Católica estabeleceu uma ponte entre o pecado de Adão e Eva numa extremidade, e a vinda de Jesus, o novo Adão que veio regenerar a humanidade nascendo do seio virginal da nova Eva, Nossa Senhora, na outra.
     É fato assente que o costume generalizou-se na França quando a princesa Hélène de Mecklembourg o trouxe a Paris em 1837, após seu casamento com o duque d’Orléans.
     Em 1841, o príncipe consorte Alberto, esposo da rainha Vitória da Inglaterra, ergueu uma árvore de Natal no castelo de Windsor.
      A partir da corte inglesa, então a mais influente da terra, o católico costume propagou-se para todo o povo inglês, e de ali para o mundo inteiro.


segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Do Tratado sobre a Contemplação de Deus, de Guilher­me, abade do Mosteiro de Saint-Thierry. (Nn. 9-11: SCh 61,90-96)



Deus nos amou primeiro

"Somente vós sois realmente Senhor, vós para quem Cominar sobre nós é salvar-nos; enquanto, para nós, servir-vos nada mais é do que ser salvos por vós.
Senhor, de vós procede a bênção e a salvação para vosso povo. Mas que salvação é esta senão a graça que nos concedeis de vos amar e de ser amados por vós?
Por isso, Senhor, quisestes que o Filho que está à vossa direita, o homem que fortalecestes para vós, fosse chamado Jesus, isto é, Salvador:pois ele vai salvar o povo de seus pecados (Mt 1,21) e em nenhum outro há salvação (At 4,12). ]Ele nos ensinou a amá-lo, ao nos amar primeiro e até à morte de cruz. Por seu amor e sua dileção, suscita nosso amor por ele, que nos amou primeiro e até o fim.
Foi assim mesmo: vós nos amastes primeiro para que: Vos amássemos. Não tínheis necessidade de ser amado por nós, mas não poderíamos atingir o fim para o qual fomos feriados se não vos amássemos.
Eis por que, tendo falado outrora a nossos pais muitas vezes e de muitos modos por intermédio dos profetas, nestes últimos tempos nos falastes pelo vosso Filho, pelo vosso verbo; por ele é que os céus foram criados, e pelo sopro de seus lábios, todo o universo (Sl 32,6).
Para vós, falar por meio do vosso Filho não foi outra coisa senão trazer à luz do sol, isto é, manifestar claramente B quanto e como nos amastes, vós que não poupastes vosso próprio Filho, mas o entregastes por todos nós. E ele também nos amou e se entregou por nós.
É essa, Senhor, a Palavra que nos dirigistes, o Verbo todo-poderoso. Quando todas as coisas estavam envolvidas no silêncio (cf. Sb 18,14), ou seja, nas profundezas do erro, ele desceu do seu trono real (Sb 18,15) para combater energicamente todos os erros e fazer triunfar suavemente o amor.
E tudo o que ele fez, tudo o que disse na terra, até aos opróbrios, até aos escarros e às bofetadas, até à cruz e à sepultura, não foi senão a palavra que nos dirigistes em vosso Filho, suscitando pelo vosso amor o nosso amor por vós.
Bem sabíeis, ó Deus, Criador dos homens, que este amor não pode ser imposto, mas que é necessário estimulá-lo no coração humano. Porque onde há coração não há liberdade, e onde não há liberdade também não há justiça.
Quisestes assim que vos amássemos, pois não podería­mos ser salvos com justiça sem vos amar; e não poderíamos amar-vos sem receber de vós esse amor.
Por isso, Senhor, como diz o Apóstolo do vosso amor e nós também já dissemos, vós nos amastes primeiro; e amais primeiro todos os que vos amam.
Nós, porém, vos amamos com o afeto do amor que pusestes em nós. Mas vosso amor, vossa bondade, ó suma­mente bom e sumo bem, é o Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho. Desde o princípio da criação ele pairava sobre as águas, isto é, sobre os espíritos indecisos dos filhos dos homens; ele se oferece a todos, atrai tudo a si, inspirando, encorajando, afastando as coisas nocivas, providenciando as úteis, unindo Deus a nós e unindo-nos a Deus."

Do Cântico espiritual, de São João da Cruz, presbítero (Red. B, str. 36-37, Edit. E. Pacho, S. Juan de la Cruz, Obras completas, Burgos, 1982, p. 1124-1135) (Sec. XVI)


Conhecimento do mistério escondido em Cristo Jesus

"Embora os santos doutores tenham explicado muitos mistérios e maravilhas, e pessoas
 devotadas a esse estado de vida os conheçam, contudo, a maior parte desses mistérios
 está por ser enunciada, ou melhor, resta para ser entendida.
Por isso é preciso cavar fundo em Cristo, que se assemelha a uma mina riquíssima,
contendo em si os maiores tesouros; nela por mais que alguém cave em profundidade,
nunca encontra fim ou termo. Ao contrário, em toda cavidade aqui e ali novos veios de
novas riquezas.
Por este motivo o apóstolo Paulo falou acerca de Cristo: Nele estão escondidos todos os
tesouros da sabedoria e da ciência de Deus (Cl 2, 3). A alma não pode ter acesso a estes
tesouros, nem consegue alcançá-los se não houver antes atravessado e entrado na
espessura dos trabalhos, sofrendo interna e externamente e sem ter primeiro recebido
de Deus muitos benefícios intelectuais e sensíveis e sem prévio e contínuo exercício
espiritual.
Tudo isto é, sem dúvida, insignificante; são meras disposições para as sublimes
profundidades do conhecimento dos mistérios de Cristo, a mais alta sabedoria a que se
pode chegar nesta vida.
Quem dera reconhecessem os homens ser totalmente impossível chegar à espessura das
riquezas e da sabedoria de Deus! Importa antes entrar na espessura das labutas,
suportar muitos sofrimentos, a ponto de renunciar à consolação e ao desejo dela. Com
quanta razão a alma, sedenta da divina sabedoria, escolhe antes em verdade entrar na
espessura da cruz.
Por isso, São Paulo exortava os efésios a não desanimarem nas tribulações, a serem
fortíssimos, enraizados e fundados na caridade, para que pudessem compreender, com
todos os santos, qual a largura, o comprimento, a altura, a profundidade, e conhecer o
amor de Cristo, que ultrapassa todo conhecimento, a fim de serem cumulados até
receber toda a plenitude de Deus (Ef 3, 17-19).
Já que a porta por onde se pode entrar até esta preciosa sabedoria é a cruz, e é porta
estreita, muitos são os que cobiçam as delícias que por ela se alcançam; pouquíssimos os
que desejam por ela entrar."

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Do Tratado de Santo Agostinho, bispo, «Contra Fausto» (L. 20, 21: CSEL 25, 562-563) (Sec. V) Celebremos os Mártires com um culto de amor e comunhão




Celebremos os Mártires com um culto de amor e comunhão

          "O povo cristão celebra a memória dos seus Mártires com religiosa solenidade, para se animar a imitá los, participar dos seus méritos e ser ajudado com a sua intercessão; não dedica, porém, altares aos Mártires, mas apenas em memória dos Mártires.
           Com efeito, qual é o bispo que, ao celebrar a missa sobre os sepulcros dos Santos, disse alguma vez: Nós te oferecemos a ti, Pedro, ou a ti, Paulo, ou a ti, Cipriano? A oblação é feita a Deus, que coroou os Mártires, junto dos sepulcros daqueles que Deus coroou, para que a evocação desses lugares santos desperte em nós um sentimento mais vivo de amor àqueles a quem podemos imitar e Àquele cujo auxílio nos torna possível a imitação.
            Veneramos os Mártires com um culto de amor e de comunhão, semelhante ao que dedicamos nesta vida aos santos homens de Deus, cujo coração sabemos estar já disposto ao martírio em testemunho da verdade do Evangelho. Mas àqueles que já superaram o combate e vivem triunfantes numa vida mais feliz, prestamos este culto de louvor com maior devoção e confiança do que àqueles que ainda lutam nesta vida.
Contudo, o culto chamado de latria, que consiste na adoração devida à divindade, reservamo-lo só para Deus, e não o prestamos aos Mártires nem ensinamos que se lhes deva prestar.
            Como a oblação do sacrifício faz parte deste culto de latria – e por isso se chama idolatria a oblação feita aos ídolos – nós não o oferecemos nem mandamos oferecer aos Anjos, aos Santos, aos Mártires; e se alguém cai em tão grande tentação, é advertido com a verdadeira doutrina, para que se corrija e tenha cuidado.
            Os Santos e os homens recusam-se a apropriar-se destas honras devidas exclusivamente a Deus. Assim fizeram Paulo e Barnabé quando os habitantes da Licaónia, impressionados com os milagres feitos por eles, quiseram oferecer-lhes sacrifícios como se fossem deuses; mas eles, rasgando os seus vestidos, proclamaram que não eram deuses, e deste modo impediram que lhes fossem oferecidos sacrifícios.
            Uma coisa, porém, é o que nós ensinamos, e outra o que nós suportamos; uma coisa é o que mandamos fazer, e outra o que queremos corrigir e nos vemos forçados a tolerar, enquanto não conseguimos corrigi-lo."

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Lembrai-vos: a oração de São Bernardo que comove o coração de Nossa Senhora


Madonna Lochis, C.Crivelli, Bergamo, Itália

         O Lembrai-vos é uma oração a Nossa Senhora, também conhecida como “Memorare” (do nome em latim) ou como “Oração de São Bernardo(a quem é atribuída a autoria). No século XVI, o Padre Claude Bernard divulgou extraordinariamente esta piedossísima oração.


A oração em Português:
Lembrai-vos, ó puríssima Virgem Maria,
que nunca se ouviu dizer
que algum daqueles que têm recorrido à vossa proteção,
implorado a vossa assistência,
e reclamado o vosso socorro,
fosse por Vós desamparado.
Animado eu, pois, com igual confiança,
a Vós, o Virgem entre todas singular,
como a Mãe recorro, de Vós me valho e,
gemendo sobre o peso dos meus pecados,
me prostro a vossos pés.
Não rejeiteis as minhas súplicas,
ó Mãe do Verbo de Deus humanado,
mas dignai-Vos de as ouvir propícia,
e de me alcançar o que vos rogo.
Amén.

Nossa Senhora de Avioth, França
Nossa Senhora de Avioth, França
Em Latim
MEMORARE, O piissima Virgo Maria,
non esse auditum a saeculo,
quemquam ad tua currentem praesidia,
tua implorantem auxilia,
tua petentem suffragia,
esse derelictum.
Ego tali animatus confidentia,
ad te, Virgo Virginum, Mater, curro, ad te venio,
coram te gemens peccator assisto.
Noli, Mater Verbi, verba mea despicere;
sed audi propitia et exaudi.
Amen.


          Na lindíssima oração do “Memorare” cada palavra tem sua aplicação.
          “Lembrai-Vos, ó Piíssima Virgem Maria...”, o que quer dizer aí, “Piíssima”?
           Piedosa, o superlativo é piedosíssima. Mas a gente resume dizendo “piíssima”.
         Mas “piedosa” aqui, não quer dizer pessoa que reza muito. Quer dizer a pessoa que tem muita piedade, muita compaixão dos outros.


Nossa Senhora com o Menino Jesus. Igreja de Todos os Santos, Londres
Nossa Senhora com o Menino Jesus. Igreja de Todos os Santos, Londres

    Poderia dizer portanto, “Lembrai-Vos, ó Compassivíssima Virgem Maria”, que tem muita compaixão, que perdoa muito, etc., etc.
     “... que nunca se ouviu dizer ...”. Notem bem “nunca se ouviu dizer”. “Nunca” quer dizer em nenhum tempo e em nenhum lugar de toda a terra.
     “... que tendo alguém recorrido a Vossa proteção ...”, quer dizer tendo alguém pedido que Vós a protegeis.
    “ ... implorado a vossa assistência ...”, quer dizer implorado que o acompanheis, que olheis para ele, que o sigais.
           “... e reclamado o Vosso socorro ...”, é evidente o sentido.
           “... fosse por Vós desamparado ...”, é uma linda proclamação.  
         Então, em nenhuma época do mundo, a Virgem Maria deixou de atender àqueles que pedem a Ela. Em nenhum caso, em nenhuma circunstância, deixaram de ser atendidos.
         Então, é também conosco, se um de nós tem a infelicidade de pecar. Pior ainda, se um de nós tem a infelicidade de um vício, de uma atitude moral ou imoral, que se repete.
        Não faz mal, reze e peça, reze e peça, porque no fundo Nossa Senhora acabará tendo pena.
         “... Animado, eu pois, com tal confiança ...”, quer dizer, por este motivo.
        “... a Vós, ó Virgem entre todas singular ...”, quer dizer, “Vós que sois mais virgem do que todas as virgens, a Santa Virgem das virgens”.
       “ ... ó Vós entre todas singular, como Mãe recorro e de Vós me valho ...”, quer dizer, “Vós sois minha Mãe, Vós sois Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas Vós sois Mãe de todos os homens.

Nossa Senhora do Carmo, Portugal
Nossa Senhora do Carmo, Portugal

       E sendo Mãe de todos os homens, sois minha Mãe! Eu serei o último dos homens, mas Vós sois a mais alta e a mais excelsa de todas as mães.
       E vossa compaixão vale mais do que merecem todos os meus pecados. Se meus pecados são um abismo, a vossa compaixão é uma montanha muito maior do que esse abismo.”
      “... e gemendo sobre o peso dos meus pecados, me prosto aos vossos pés...” A pessoa então, é um pecador que geme. Pecou tanto que ele está gemendo sobre os pesos de seus pecados, mas se põe aos pés da Virgem Santíssima.
     “... Não desprezeis as minhas súplicas, ó Mãe do Verbo de Deus humanado...”, quer dizer, “Mãe, ó Vós que sois a Mãe de Jesus Cristo, o Verbo que se fez homem, não desprezeis a minha súplica.”
     Quer dizer, eu sei que dá para desprezar minhas súplicas porque por si mesmas não são nada. Mas, não desprezeis essas súplicas porque eu sou vosso filho. E um filho pode pedir isso a uma mãe.
        O coração da mãe está sempre aberto para perdoar, para amar, para afagar, etc., etc. Sobretudo Nossa Senhora, que é a Mãe das mães, a perfeição das perfeições.
         “... mas dignai-Vos de ouvir propícia...”, quer dizer, dignai de ouvir. “Propícia” quer dizer favoravelmente, com boa vontade, com boa disposição.
          “... e alcançar o que Vos rogo. Assim seja.”, e alcançai-me aquilo o que eu estou Vos pedindo. É a emenda de um defeito, emenda de um vício, aquisição de uma virtude, etc., etc.


Nossa Senhora da Flor de Lys
Nossa Senhora da Flor de Lys

   Considerando tudo quanto a Igreja ensina sobre Nossa Senhora, temos todos os motivos para achar que Ela vai acabar obtendo. E portanto, nós pedimos a Ela, com muito empenho, com muito ardor.
   Numa canção litúrgica muito bonita e piedosa, Nossa Senhora é chamada: — em latim: Montanha de todas as virtudes Maria mons. Ela é a fonte de todas as graças:Maria fons. E por fim, Maria pons:Ela é a ponte por cima de todos os abismos.
  “Nós vos pedimos, Senhora, quando pensamos que Vós sois tudo quanto sois, que nós não somos senão aquilo que nós somos.
    “Mas que nunca, nunca, nunca, Vós deixareis de olhar com boa vontade para o filho que pede a Vossa assistência. Nós pedimos com insistência, tende pena de nós e acabai arrancando dos nossos pecados.”

Nós seremos atendidos!

Nossa Senhora da Vitória abriu as portas de Málaga aos católicos


Nossa Senhora da Vitória, padroeira de Malága, Espanha



        Em 1487 iniciou o rei católico Fernando o sítio de Málaga com um exército imponente. Uma vez estabelecido na proximidade, procurou persuadir seus habitantes a que lhe entregassem a praça, para evitar as destruições de um sítio.
       O tirano que dominava a cidade, Hamet el Zegrí, mandou degolar os que participavam das tratativas, e então o Rei intimou a cidade a se render, mas ela se recusou.
           Deu início então ao sítio, instalando diante dos muros de Málaga seus efetivos, e em meio a eles uma espécie de templo, onde mandou pôr uma imagem da Virgem, que sempre levava consigo.
         Começou uma luta duríssima, em que a artilharia tinha muita parte. Antes de continuar a destruição da cidade, ainda foi feita uma segunda intimação a Zegrí, que a rechaçou mandando degolar uma comissão de muçulmanos que quis mostrar-lhe o perigo de prolongar um sítio sem esperanças de vitória.

Nossa Senhora da Vitória, padroeira de Malága, Espanha
     Obstinou-se na luta, apesar das muitas derrotas, praticando crueldades contra os seus. Depois do fracasso de uma sortida, fechou-se numa torre-fortaleza fora da cidade, abandonando-a à sua própria sorte. Ao se verem livres do jugo de Zegrí, os mouros pediram ao Rei que os deixasse voltar para a África ou viver em Castela, o que lhes foi recusado.
       Declararam então os da cidade sitiada que, se não obtivessem isso, enforcariam nas ameias quinhentos cristãos cativos, ateariam fogo à cidade, exterminando suas famílias, e tratariam de morrer matando.

           Estavam assim as coisas quando, a 18 de agosto, de improviso se rendeu a praça. Nela entraram imediatamente as tropas castelhanas, pondo a cruz nas torres do forte. Diante dele se ajoelharam os reis católicos e foi cantado o Te Deum.
           Isabel e Fernando atribuíram a um milagre da Santíssima Virgem esse triunfo.
         Para perpétua memória, em ação de graças mandaram edificar um templo no local em que estava a santa imagem que levavam. Desde então recebeu o nome de Nossa Senhora da Vitória, com o qual até hoje é venerada como padroeira de Málaga.

Nossa Senhora da Conceição da Escada

Nossa Senhora da Conceição da Escada



        Não é de estranhar que, pela acentuada vocação marítima de Portugal, tenha sido a devoção dos marinheiros de Lisboa uma das mais populares no país, e, por essa razão, uma das primeiras a se implantar no Brasil.
       Escada? Que nome estranho para designar uma devoção a Nossa Senhora, poderão pensar alguns ao ouvi-lo. Outros, mais eruditos, estabelecerão talvez um nexo com a escada de Jacó, narrada na Sagrada Escritura, pois o Patriarca sonhou com uma escada que levava ao Céu. De modo análogo, Nossa Senhora leva ao Céu, logo... E ainda outros, quiçá, relacionarão o nome com imagens da Paixão de Cristo, dado que, muitas vezes, Nossa Senhora aparece ao lado da escada utilizada para descer o corpo de seu Divino Filho da cruz.
        O que ninguém consegue imaginar é a razão verdadeira da invocação Nossa Senhora da Conceição da Escada.

Na origem do nome, singeleza de circunstâncias naturais

        Qualquer pessoa dotada de cultura básica conhece a enorme importância que tiveram as navegações e descobrimentos portugueses nos séculos XV e XVI, bem como o fato de terem sido os navegantes lusos que uniram, por via marítima, diversos continentes. E que tal epopeia ocorreu mediante viagens realizadas a bordo de navios que, se comparados aos de hoje, eram semelhantes a frágeis cascas de nozes.
       Coragem não faltou aos navegantes daquela época. Também não faltou fé e fortaleza para correr todos os riscos. E tal fé dos marinheiros lusos encontrava uma expressão encantadora na devoção a Nossa Senhora da Conceição da Escada, na cidade de Lisboa.
       A imagem original da Virgem Santíssima – que depois ficou conhecida sob essa invocação – é muito antiga, anterior à reconquista da cidade aos mouros, em 1147. Ela se encontrava em uma capela situada à margem do rio Tejo. Ao partir, os marinheiros encomendavam-lhe seus trabalhos, e agradeciam sua proteção ao voltar. Como a margem do rio é elevada, precisavam subir ou descer os 31 degraus que separam a capela do rio. Por isto, com a passar do tempo, a imagem de Nossa Senhora da Conceição começou a ser chamada de Conceição da Escada, para diferenciá-la de outras imagens de Nossa Senhora da Conceição (devoção muito difundida em Portugal). Desse fato resultou que a imagem passou a ser conhecida como Nossa Senhora da Escada.
       Dada a importância que a vida ligada ao mar tinha para o povo português naquela época, é compreensível que a referida imagem fosse das mais veneradas. De onde se explica que, cada vez que se decidia a realização de procissões para celebrar tal ou qual vitória, ou pedir proteção contra este ou aquele flagelo, eram as procissões da capela de Nossa Senhora da Escada das mais concorridas.
        Com o tempo, começaram a acorrer à capela pessoas em barcos de locais longínquos, a fim de cumprir promessas e votos, bem como agradecer favores recebidos. Numa determinada época, realizava-se uma procissão com tochas acesas, provavelmente à noite, que descia o rio até chegar à capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição da Escada.

Nossa Senhora da Conceição da Escada
Vitória de Aljubarrota fortalece devoção

     A procissão mais importante, porém, era a que comemorava a vitória dos portugueses em Aljubarrota, no ano de 1385. As tropas portuguesas, comandadas pelo Venerável Nun'Álvares Pereira, lutavam não só para defender a independência do país, mas sobretudo para este não cair no cisma que ameaçava dividir a Cristandade, já que o Rei de Castela na ocasião apoiava um antipapa.
     Após travarem a luta em condições de inferioridade numérica, os portugueses obtiveram memorável vitória. Ao ter notícia do triunfo, o povo acudiu em massa aos diversos santuários do país, e um dos mais concorridos foi o de Nossa Senhora da Escada, onde pessoas de todas as classes sociais se dirigiram para agradecer a Nossa Senhora a insigne proteção. Que tenham sido de todas as classes sociais não é de estranhar, pois à Marinha dedicavam-se representantes de todos os segmentos sociais da época. Desde os nobres mais elevados que comandavam as armadas com destino à África ou à Ásia, até os mais humildes servidores.

Devoção expande-se para Bahia e São Paulo

         Com as descobertas marítimas que iam sendo feitas, a Fé católica ia se expandindo. Por isso, ao dominar novos territórios, uma das primeiras preocupações dos portugueses era ensinar as verdades da Fé aos habitantes do local. E nada melhor para consolidar uma alma no caminho da verdadeira Religião do que ensiná-la a amar e confiar naquela que é a Mãe de Deus, e por isso mesmo, nossa advogada.
         Como dois dos primeiros locais a serem colonizados em nosso País foram a Bahia de Todos os Santos e zonas na região próximas ao litoral de São Paulo, é compreensível que aí se encontrem as duas capelas dedicadas a Nossa Senhora da Escada.
      A existente na Bahia apresenta uma característica muito antiga, da época da escravidão: os escravos, quando ainda não batizados, não podiam ficar dentro da Igreja, permanecendo num alpendre junto à entrada. É por isso que o pequeno templo possui um amplo alpendre.
        A outra capela situava-se numa vila chamada Escada, nome este proveniente da própria invocação mariana. Tal capela está situada cerca de Guararema, cidade a 80 quilômetros da capital paulista. Devido à sua proximidade do rio Paraíba, essa vila era frequentada tanto por pescadores como por viajantes que navegavam rumo ao Rio de Janeiro.
       Quando passou por lá, em 1717, o Conde de Assumar, Governador de São Paulo, Escada era uma vila que já possuía sua própria Câmara Municipal. Mas o pequeno núcleo não prosperou, e com sua decadência também foi minguando a devoção mariana que lhe deu origem.
        As devoções marianas não constituem, via de regra, um fruto artificial, ocasionado por algum interesse humano. Elas florescem naturalmente quando Nossa Senhora distribui suas graças, valendo-se, por exemplo, de uma imagem sob esta ou aquela invocação. E se o povo é verdadeiramente piedoso, costuma corresponder a essas graças, propaga-se naturalmente a devoção Àquela que o sustenta nas duras lutas da vida.
        Quando, porém, a população decai em fervor e não mais invoca a Virgem Santíssima, as devoções ligadas a alguma capela ou imagem também por vezes decaem. As pessoas deixam de frequentar o local, e vão se olvidando das graças recebidas. Nessas condições, não raro Nossa Senhora opera novo prodígio, a fim de reerguer a antiga devoção. Mas, infelizmente, nem sempre os homens correspondem à nova manifestação da bondade materna.

Dois terremotos e decadência da devoção

        Foi o que aconteceu com a imagem de Nossa Senhora da Escada em Portugal. Em 1531 um terremoto destruiu a capela, que foi reedificada. Mas como a devoção continuava decaindo aos poucos, permitiu Nossa Senhora que novo terremoto em Lisboa, mais terrível que o anterior, destruísse o pequeno templo em 1755. Nos dois casos, os edifícios que abrigavam a imagem foram destruídos, salvando-se contudo, milagrosamente, entre as ruínas, tanto a efígie mariana como o altar em que ela se encontrava.
         A decadência do culto a Nossa Senhora sob essa invocação havia chegado a tal ponto, que a capela da Escada não foi mais reconstruída. Por isso, a primitiva imagem foi levada para o templo de Nossa Senhora das Mercês em Lisboa, onde se encontra até hoje. Pareceria um triste fim de uma invocação mariana antes tão difundida.

Renascimento promissor

       Entretanto, a devoção não morreu. Ela deitou raízes em nosso País, surgindo várias capelas a ela dedicadas, como a que foi edificada na vila da Escada, acima referida, no Estado de São Paulo, e anos atrás em Curitiba, no bairro Novo Mundo.
        Peçamos à Mãe de Deus que este seja um sinal do revigoramento dessa bela devoção tão acendrada em nossos ancestrais lusos, especialmente os navegadores, que a trouxeram para a Terra de Santa Cruz.
        Nossa Senhora da Conceição da Escada é a Padroeira da cidade de Barueri, cuja festa celebra-se em 21 de novembro.