quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo (Sermão 340, 1: PL 38, 1483-1484) (Sec. V)

  
Martírio de São Januário, bispo


Sou bispo para vós, sou cristão convosco

        "Desde o momento em que foi colocado sobre os meus ombros este cargo de tanta responsabilidade, atormenta me a preocupação da dignidade que a acompanha. De facto, o que há de mais temível neste ministério é o perigo de nos satisfazer mais o seu aspecto honorífico do que a sua utilidade para a vossa salvação. Mas se por um lado me atemoriza o que sou para vós, por outro lado consola me o que sou convosco. Sou bispo para vós, sou cristão convosco. Aquele nome significa um encargo recebido, este exprime o dom da graça; aquele é ocasião de perigo, este é caminho de salvação.
          Na nossa atividade episcopal sentimo nos como num mar imenso e tempestuoso; mas quando recordamos Aquele que nos remiu com o seu sangue, é como se entrássemos num porto seguro e tranquilo; e se o cumprimento dos deveres próprios do nosso ministério exige trabalho e esforço, o dom de ser cristão, do qual participamos convosco, representa o nosso descanso. Portanto, se me agrada mais o pensamento de ter sido resgatado convosco do que o de ter sido constituído vosso chefe espiritual, então devo entregar me mais generosamente ao vosso serviço, segundo o mandato do Senhor, para não ser indigno do preço pelo qual mereci ser vosso irmão no serviço de Deus. De facto, devo amar o Redentor e sei o que Ele disse a Pedro: Pedro, amas me? Apascenta as minhas ovelhas. E disse o uma, duas, três vezes. Interrogava sobre o amor e impunha o trabalho, porque, quanto maior é o amor, menor é o trabalho.
         Que retribuirei ao Senhor por tudo quanto Ele me concedeu? Se disser que devo retribuir com o ministério de apascentar as suas ovelhas, esqueceria que isso o faço, não eu, mas a graça de Deus comigo. Como retribuirei ao Senhor, se n’Ele está a origem de todas as minhas obras?
    E, todavia, apesar de amarmos desinteressadamente e de apascentarmos gratuitamente as suas ovelhas, como podemos esperar uma recompensa? Como é possível conciliar estas duas coisas: «Apascento, porque amo gratuitamente» e «Espero a recompensa porque apascento?». De modo nenhum seria possível, de modo algum esperaria a recompensa d’Aquele que é amado gratuitamente, se a recompensa não fosse Aquele mesmo que é amado. Se Lhe retribuímos o dom da redenção apascentando as suas ovelhas, que havemos de retribuir por nos ter constituído pastores? Efetivamente, maus pastores – queira Deus que nunca o sejamos – somo lo por nossa culpa; ao passo que bons pastores – queira Deus que sempre o sejamos – não o podemos ser sem a sua graça. Por isso, meus irmãos, vos exortamos a que não recebais a graça de Deus em vão. Fazei que seja frutuoso o nosso ministério. Sois a agricultura de Deus. Recebei a atuação exterior daquele que planta e rega, e a ação interior d’Aquele que faz crescer. Ajudai nos com a vossa oração e com a vossa obediência, de modo que encontremos maior alegria em ser vossos servos do que em ser vossos chefes."
 
 

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